Existe uma crença comum de que comer gordura inevitavelmente leva ao aumento de peso. Apesar de este conceito parecer lógico à primeira vista, será que tem fundamento ou não passa de um mito nutricional?
A relação entre o consumo de gordura na alimentação e o peso corporal continua a ser um tópico amplamente debatido na ciência da nutrição. Embora existam estudos relevantes, poucos examinam as mudanças a longo prazo nos diferentes tipos de gordura consumidos e o seu impacto no peso corporal.
Nutricionalmente falando
Os alimentos fornecem energia através de três macronutrientes: hidratos de carbono, proteínas e gorduras. Cada um tem funções vitais no corpo humano e contribui para as calorias totais ingeridas. No entanto, o que acontece quando ingerimos mais calorias do que gastamos? O corpo armazena o excesso sob a forma de gordura corporal.
Frequentemente, ouve-se a expressão “calorias consumidas menos calorias gastas resultam na acumulação de gordura”. Mas será que todas as calorias têm o mesmo impacto no organismo? A resposta é não.
A gordura fornece 9 calorias por grama, mais do que o dobro das calorias fornecidas por hidratos de carbono e proteínas (4 calorias por grama). Este facto leva à ideia de que consumir gordura resulta diretamente no aumento de peso. No entanto, o metabolismo humano é mais complexo do que uma simples matemática calórica.
O papel das gorduras
As gorduras são indispensáveis ao corpo humano. Além de serem uma fonte de energia, desempenham funções cruciais:
- Produção de hormonas: A gordura é essencial para a síntese de hormonas como os esteróides, fundamentais para o equilíbrio metabólico e reprodutivo.
- Regulação do apetite: A gordura influencia a produção de leptina, uma hormona que promove a saciedade, reduzindo o apetite e auxiliando no controlo do peso.
- Absorção de nutrientes: As vitaminas lipossolúveis (A, D, E e K) só podem ser absorvidas em presença de gordura, tornando este macronutriente vital para a saúde geral.
Evidência científica: tipos de gordura e impacto no peso
Uma pesquisa liderada por Frank Hu, M.D., da Universidade de Harvard, analisou dados de mais de 120.000 pessoas durante 20 anos para investigar o impacto dos diferentes tipos de gordura no peso corporal. Os resultados demonstraram que:
- Gorduras saturadas e trans: Estavam associadas ao aumento de peso e gordura visceral. Estas gorduras promovem a resistência à insulina, dificultando a absorção de glicose pelas células, o que pode levar ao armazenamento de gordura.
- Gorduras insaturadas: O aumento do consumo de gorduras insaturadas, sobretudo as de origem vegetal (como azeite, nozes e abacate), foi relacionado à manutenção ou até à redução do peso corporal.
Embora o estudo ofereça insights importantes, é importante reconhecer as suas limitações, como potenciais erros nos registos alimentares dos participantes e a sua aplicabilidade reduzida a populações fora do perfil estudado.
Conclusão: o equilíbrio importa
O consumo de gordura não é o único fator determinante para o aumento de peso. Embora o excesso calórico proveniente de qualquer fonte contribua para a acumulação de gordura, o tipo de gordura ingerido faz toda a diferença. Gorduras saturadas e trans devem ser limitadas, enquanto gorduras insaturadas (particularmente de fontes vegetais) são fundamentais para uma dieta equilibrada.
Em Portugal, a Direção-Geral da Saúde (DGS) recomenda:
- Priorizar gorduras insaturadas: Fontes como azeite, peixes gordos, sementes e frutos secos devem ser privilegiadas.
- Limitar gorduras saturadas e evitar gorduras trans: Encontradas em alimentos processados, fast food e produtos industriais.
Uma abordagem equilibrada, focada na qualidade e não na eliminação total de gorduras, aliada a um estilo de vida ativo, é a chave para uma saúde metabólica ideal e controlo do peso sustentável. Afinal, as gorduras, quando escolhidas e consumidas adequadamente, são aliadas valiosas na manutenção da saúde.
Texto elaborado pela Nutricionista Catarina dos Santos (4167N)
Equipa IPS – Nutrição Clínica